Foi inaugurado hoje, no bairro Bauxita, o novo Fórum da Comarca de Ouro Preto. Trata-se de uma moderna edificação que reunirá em só lugar o setor administrativo e todos os procedimentos que envolvem os trabalhos dos juizados Cíveis, Criminal e da Infância e Juventude. Hoje, estas sessões encontram-se divididas em duas sedes distintas, uma na praça Reinaldo Alves de Brito, outra na Rua Teixeira Amaral, ao lado da Igreja de São José.
As obras foram iniciadas em 2019 com previsão inicial de serem concluídas até agosto de 2021. Porém, uma série de dificuldades trazidas pelo surto mundial do novo coronavírus, principalmente a ausência de alguns materiais e equipamentos no mercado, provocaram atrasos no cronograma da construção.
O novo Fórum foi projetado de acordo com os padrões dos grandes Fóruns do Estado, e além de agilizar e facilitar os procedimentos internos, garantirá mais acessibilidade, segurança e conforto aos funcionários e usuários, contribuindo também para desafogar o trânsito de veículos no centro histórico. O prédio, com três andares, ocupa uma área de 4.000m². A construção conta com salas para testemunhas, salão do júri e secretarias, sala especial para receber crianças que necessitam comparecer ou apenas acompanhar seus responsáveis nas audiências, e ainda espaço destinado à OAB, além de estacionamento para 250 veículos e área para carga e descarga com acesso para caminhões. Todas as salas possuem isolamento acústico e todo o prédio foi construído seguindo normas de acessibilidade. Para a inauguração, está confirmada a presença do Desembargador Gilson Soares Lemes, Presidente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, dentre várias outras autoridades.
Para marcar a conclusão das obras do arrojado complexo da Justiça no município, o Diário de Ouro Preto conversou com a Juíza Diretora do Fórum da Comarca de Ouro Preto, Dra. Ana Paula Lobo Pereira de Freitas. Durante a entrevista, além de comentar sobre os efeitos que a mudança para o novo prédio trará para a população, a Juíza comentou também sobre os diferenciais existentes na área territorial onde ela exerce sua jurisdição e contou um pouco da sua vida pessoal, lembrando os desafios da participação feminina no Poder Judiciário.
DIÁRIO DE OURO PRETO – Sobre a mudança e a organização da Comarca toda em um prédio só, como vai ser isso?
DRA. ANA PAULA – A gente já está trabalhando nessa mudança desde o ano passado. Com a pandemia, a Justiça precisou se adaptar e hoje a gente consegue jurisdicionar de uma forma até melhor do que antes. Os processos das varas cíveis estão 100% digitalizados e isso já refletiu em um trabalho a menos na mudança. O juizado também está na eminência de alcançar os 100% e, atualmente, apenas a vara criminal é que está pendente da virtualização integral do acervo. Portanto, estamos bem adiantados e prontos para a mudança. Essa é uma demanda antiga e essa unificação da equipe é também um reconhecimento ao trabalho dos servidores, é uma união que tem que existir. Cada juiz já levou sua equipe para conhecer as novas instalações e todos ficaram surpreendidos. Nós ainda não estamos com a estrutura dos três andares pronta, falta gerar energia para os dois últimos andares, o que deve ocorrer até o dia 30 de maio.
DIÁRIO DE OURO PRETO – Uma curiosidade geral da população de Ouro Preto é saber: que será feito do prédio que a Justiça ocupava no centro histórico, na Praça Reinaldo Alves de Brito?
DRA. ANA PAULA – Vocês querem um spoiler, né (risos)? A ideia não é minha, é da direção e vem desde os tempos da Dra. Lúcia de Fátima Albuquerque que, sabendo da importância do prédio setecentista (imóvel da Praça Reinaldo Alves de Brito), que é maravilhoso e preserva as características originais, a gente pretende criar ali um Museu do Judiciário, com salas expositivas, fazendo uso do mobiliário preservado desde o Tribunal das Relações, o primeiro Tribunal de Segunda Instância de Minas Gerais. O salão histórico do Tribunal do Júri, com suas urnas e mobiliário originais, tudo deverá ser preservado, graças a quem me antecedeu, a Dra. Lúcia, que sempre teve muito carinho com o prédio. A ideia partiu dela e nós a seguimos. Hoje, já existe um processo interno com aprovação para a instalação desse museu que, possivelmente, mostrará a evolução da linha humanística da Justiça.
DIÁRIO DE OURO PRETO – Sobre as peculiaridades do território ouro-pretano, que reúne questões que misturam temas diferenciados como mineração, história e patrimônio artístico, qual o maior desafio de legislar aqui?
DRA. ANA PAULA – Eu acho que o grande desafio é conjugar isso tudo. Já estive em outras Comarcas e o grande diferencial que eu realmente encontrei em Ouro Preto foi essa riqueza histórica que a gente tem. E a nossa instabilidade geológica. Nós temos aqui elementos diversos que não podem ser desconsiderados e a gente classificar demandas como “importantes” é menosprezar aquele que, às vezes por mais de um ano, espera por aquilo. Ter a sensibilidade de levar em conta o social, o histórico, o ambiental, o grande desafio é mesclar isso tudo sem esquecer que, por trás de cada processo, tem uma pessoa que está esperando ansiosamente por aquele momento. Cada demanda é única, eu sempre entro em toda audiência com esse pensamento.
DIÁRIO DE OURO PRETO – Como é conciliar as obrigações de Juíza com a vida em família?
DRA. ANA PAULA – Eu tenho duas filhas que gostam de vir ao Fórum, uma até diz com todas as letras que quer ser juíza sem nunca ter sido instruída para isso. Aqui a gente vivencia muito o lado da vulnerabilidade das mulheres, da dependência financeira, por isso eu não me culpo por muitas vezes estar ausente, porque eu acho que assim minhas filhas estão aprendendo também, vivenciando uma mãe que trabalha, que consegue a independência dela. Não vou deixar de falar, é pesado, mas eu acho que, quando você está fazendo o que gosta, você passa essa leveza e leva esse amor para dentro de casa, e isso sai de forma natural. A resposta vem quando você vê suas filhas tendo você como exemplo.
Sobre a mudança para as novas instalações, a Juíza Diretora do Fórum da Comarca de Ouro Preto, Dra. Ana Paula, confessou que sentirá saudades da paisagem da janela de sua antiga sala, de onde ela avistava o Pico do Itacolomi, mas declarou que faz questão de levar um quadro, uma pintura com um registro deste mesmo cenário para o seu gabinete no novo Fórum.
Por Victor Stutz e Marcelino de Castro
Foto: Arquivo diário de Ouro Preto