A Constituição Brasileira determina que cabe à família, à Sociedade e ao Estado garantir segurança, bem-estar e proteção aos mais velhos. No entanto, por diversos motivos, é comum as famílias não conseguirem assegurar aos seus idosos esses direitos. Por isso, entidades civis assistenciais lutam para disponibilizar cuidados essenciais de acolhimento, cuidados e proteção, o que depende diretamente de parcerias estabelecidas, principalmente, com o setor público.
Nos 18 anos da promulgação do Estatuto do Idoso, documento oficializado em 1º de outubro de 2003 para regular os direitos assegurados às pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, representantes do Lar São Vicente de Paula de Ouro Preto compareceram à Câmara Municipal, na 78ª Reunião Ordinária realizada na terça-feira, 16, em atendimento ao requerimento do vereador Renato Zoroatro. O tema do debate girou em torno dos graves problemas que a instituição está vivenciando. Na tribuna, a presidente da entidade, Ana Maria Neves, e a assistente social, Aline Testasicca, fizeram um relato das dificuldades financeiras que, se não forem logo sanadas, colocam em risco a continuidade dos trabalhos do lar.
O Lar São Vicente de Paula é mantido principalmente por doações espontâneas da comunidade e de algumas empresas. A Prefeitura também contribui com um repasse, hoje no valor de 38 mil reais mensais. Porém, só a folha de pagamento dos funcionários alcança a cifra de 120 mil reais ao mês. Ou seja, o repasse pactuado com o Município não chega a 30 por cento dos gastos com pessoal, e ainda restam as despesas com alimentação, manutenção, medicamentos e procedimentos relacionados ao tratamento de saúde aos moradores necessitados. Atualmente, são 46 idosos que vivem no abrigo de longa permanência, e a fila de espera por vagas é grande.
O vereador Zoroastro indagou sobre as atuais premissas de políticas públicas de proteção aos idosos em Ouro Preto e, se além do auxílio financeiro, o Lar São Vicente de Paula conta com algum outro suporte proporcionado pelo governo municipal, como fornecimento de fraldas geriátricas ou materiais de limpeza. Segundo Testasicca, as instituições públicas que prestam acolhimento e atendimento aos idosos estão cada vez mais escassas, “e sobra mais uma vez para a sociedade civil providenciar esse amparo”. Ela explicou que, sempre que necessário e possível, a casa recorre aos instrumentos públicos da Previdência, como postos de saúde, CRAS, CREAS, dentre outros instrumentos. Ou seja, a entidade apela aos suportes oficiais da estrutura pública, os mesmos que os idosos contariam se estivessem vivendo com suas famílias. Aline relatou que, no caso das fraldas geriátricas, “mesmo quando disponíveis no sistema, as fraldas que o Lar recebe não são suficientes e é preciso recorrer à complementação da sociedade que também participa com doações”. A assistente relata que o consumo médio diário no abrigo é de 200 fraldas: “Da Secretaria de Saúde, recebemos alguns insumos médicos hospitalares e EPIs, mas o apoio do governo municipal termina aí”. Para agravar o clima de insegurança, as representantes do lar coletivo manifestaram preocupação com o início da cobrança sobre o consumo de água, pela Saneouro, pois, segundo elas, não existe ainda a previsão legal de isenção para instituições sociais. Sobre as despesas com energia, a entidade conseguiu, junto à Cemig, apenas o abatimento tradicionalmente concedido às instituições beneficentes. Mesmo assim, a conta de luz alcança, em média, 7 mil reais ao mês.
No plenário, alguns vereadores presentes lançaram ideias para melhorar as condições da entidade que oferece moradia, segurança, alimentação, cuidados e dignidade aos idosos provenientes de famílias de baixa renda de Ouro Preto. Dentre as sugestões apresentadas, o vereador Naércio França propôs uma união de esforços para solicitar ao prefeito Ângelo Oswaldo, à vice Regina Braga e ao secretário de Desenvolvimento Social Edvaldo César Rocha, um aumento da subvenção social concedida ao Lar São Vicente de Paula. Lançando um apelo, o vereador manifestou: “Convidamos toda a sociedade ouro-pretana para também participar com ações que ajudem os idosos que, muitas vezes, já chegam ao lar em situação de fragilidade emocional e física”.
Hoje, mesmo contando com o apoio popular, e também com o suporte da Fundação Gorceix, que colabora pontualmente com os trabalhos do Lar São Vicente de Paula de Ouro Preto, a instituição tem sido obrigada a se endividar, recorrendo a empréstimos bancários para cobrir gastos diários. Em meio a todas essas dificuldades, no ano passado, usuários e funcionários da casa foram atingidos pelo surto do coronavírus e vários óbitos ocorreram. Em razão disso, ainda hoje, o lar coletivo São Vicente de Paula de Ouro Preto sofre com as sequelas decorrentes do surto, pois os reflexos se manifestam não apenas no estado de saúde de seus idosos, mas também no aumento geral dos custos dos produtos e serviços necessários para o funcionamento dos trabalhos.
Por Victor Stutz, para o Diário de Ouro Preto